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Granja-Amareleja

Quando, em 8 de fevereiro de 2002, foi dada a ordem para fechar as comportas da barragem do Alqueva iniciava-se um ciclo de profundas transformações no Alentejo a que não foi alheia a Margem Esquerda do Guadiana e, particularmente, o triângulo formado pelas freguesias da Amareleja, Granja e Póvoa de São Miguel. À medida que a albufeira da barragem enchia, a paisagem começava a mudar radicalmente e ao atingir a cota máxima, em 2010, havia cerca de 1100 km de margem no maior lago artificial da Europa. A paisagem ressequida, de calor sufocante no verão, sem vivalma no pino do calor, deu lugar a um enorme espelho de água, com barcos a sulcar as águas e pescadores, nas margens, a tentar a sorte.

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No entanto, tirando a marcante presença da água, a paisagem da Margem Esquerda do Guadiana pouco mudou, pois a construção da rede de rega que permitiria utilizar a água ali tão perto não fez parte das prioridades definidas.

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A individualidade da Margem Esquerda do Guadiana, sempre reconhecida, deve a sua interioridade ao espartilho provocado pelo rio e uma fronteira artificial, sem obstáculos físicos que a justifiquem, mas com barreiras históricas indeléveis, que sempre contribuíram para o isolamento dos dois lados da linha divisória. Este isolamento, a sangria demográfica e o envelhecimento da população residente continuam a contribuir para uma paisagem antiquada onde prepondera o minifúndio com o olival, o montado de azinho, raras searas, a vinha de sequeiro plantada em quadrado à moda medieval, raras árvores de fruto, pequenas hortas à roda dos assentos de lavoura e algum gado.

Esta forte identidade, resistente à pressão da globalização, também se reflete nos hábitos de vida, na preservação das memórias antigas e numa sabedoria popular em perfeita sintonia com a natureza e um
sistema de agricultura sustentável
 

É preciso percorrer os caminhos de terra batida, longe das estradas principais, para reencontrar as vinhas desalinhadas, de porte baixo, com muitas falhas e veneráveis cepas retorcidas, de muitas e variadas castas. Ainda lá continuam o Moreto “manso” [de pé-franco], Alfrocheiro, Rabo de Ovelha, Roupeiro, Pendura, Perrum, Manteúdo, entre outras, para nos recordar que o encepamento antigo era outro. Estas vinhas antigas, ao contrário do que era voz comum num passado recente, já não são entendidas apenas como subdesenvolvimento, que importa eliminar quanto antes, mas como um património vitícola, histórico e antropológico, que se opõe ao rolo compressor da globalização e urge reconhecer e salvaguardar.

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Além das técnicas ancestrais com que são cultivadas, estas vinhas são campos de biodiversidade ampelográfica inestimável, onde ainda se podem reconhecer as castas antigas e algumas desconhecidas. Parte destas vinhas deveria ser reconhecida como património de interesse público e integrada nos circuitos históricos de Enoturismo do Alentejo.

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Sub-Região
Granja- Amareleja

DOP

A área geográfica da sub-região Granja-Amareleja, com direito a Denominação de Origem Protegida Alentejo (DOP Alentejo), situa-se na Margem Esquerda do Guadiana e engloba a totalidade das freguesias de Amareleja e Póvoa de São Miguel e parte das freguesias de Santo Amador e de São João Baptista, do concelho de Moura, e a totalidade das freguesias de Granja, Luz e Mourão, do concelho de Mourão.

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Quando se passeia pelos caminhos agrícolas que dão serventia às inúmeras courelas dos pequenos agricultores da sub-região, sobretudo os das freguesias de Granja, Amareleja e Póvoa de São Miguel, descobre-se um mundo antigo em vias de extinção, mas carregado de história e homenageando as mais vivas tradições agrícolas mediterrâneas. A vinha e o olival sobressaem das restantes culturas, mas também estão presentes as árvores de fruto, as hortaliças e as azinheiras, que frequentemente acolhem à sua sombra, no pino do calor, algumas cabeças de gado.

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O Solão

Quando se visitam as vinhas antigas das Courelas dos Aleixos no pino do verão fica-se surpreendido com o viço das cepas e a carga de cachos que têm, como se fossem indiferentes à seca e às várias vagas de calor que assolam a região entre junho e agosto. Com efeito, a Amareleja tem fama de ser a terra mais quente do País, a ponto de as vindimas só se fazerem de manhã, nas vinhas antigas, ou à noite, com máquinas, nas vinhas modernas, por ninguém aguentar a torreira das tardes. 

 

Como se explica, então, que as cepas e, mesmo, as oliveiras e figueiras estejam tão viçosas, sendo culturas de sequeiro?

Quando se pergunta qual é o segredo do solo (ou subsolo), todos falam no “selão” - deturpação do termo técnico “solão” - que designa formações sedimentares de natureza argilosa e arenosa. A argila nem vê-la, mas o terreno arenoso e cascalhento são uma constante, indiciando a baixa fertilidade do solo e custando a entender como é possível extrair dali produções de sequeiro tão proveitosas. Tudo aponta para que o segredo seja o “solão”, uma camada de material amarelado que existe no subsolo a maior ou menor profundidade. A elevada percentagem de argila que garante uma elevada capacidade de retenção de água e uma fertilidade que a superfície areenta do solo não permite antever. A filoxera, por sua vez, também não tem vida fácil, pois a camada superficial arenosa impede que o maléfico inseto consiga atingir as raízes das cepas, que rapidamente mergulham no solo à procura da humidade retida na argila do solão. Embora se desconheçam estudos científicos sobre o solão das Courelas dos Aleixos, é muito provável que esta formação argilosa de índole sedimentar seja a responsável pela excecional resistência das culturas à torreira do verão, às produções generosas da maior parte das culturas e à qualidade distintiva dos vinhos de Moreto, muito mais famosos do que os vinhos da casta noutros locais do Alentejo.

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